Desculpa, Dudu, eu não sei rezar

Por Fonte83 - 02/05/2021

Eu não sei rezar.

Então apenas converso com Deus.

Uma conversa cheia de dedos. As vezes confusa. Sempre cheia de dúvidas.

Ele tá me ouvindo? Tô falando a coisa certa?

Quem tem muita fé tem certeza – esses são os sortudos.

Eu não tenho tanta sorte. Nem tanta fé.

Mas orei.

Chorando.

Sorrindo.

Implorando.

De joelhos. Escovando os dentes. Fazendo feira. Trabalhando.

O tempo todo orei pedindo pra ele ficar.

Confessando, sempre, que se tratava de um pedido absolutamente egoísta.

Eu não iria esconder minhas intenções logo de Deus, né?

Pois suponho que o Onisciente sempre soube que meu pedido para ele ficar era porque o meu mundo era muito melhor com ele ao alcance de meus olhos e abraços.

Reconheço o egoísmo porque as vezes me questiono se a morte não seria uma evolução. E que o outro lado (se esse lado realmente existir) não representaria um upgrade dessa existência – que, cá pra nós, na maior parte do tempo não é exatamente uma Brastemp.

Então, egoisticamente, pedi e pedi.

Insistentemente. Agoniadamente. Esperançosamente.

Pedi e pedi só porque meu mundo era realmente melhor com ele me chamando de anã bandida. Ou, nos dias em que estava mais carinhoso, de azeitoninha – segundo ele, a maior declaração de amor que um pizzaiolo pode fazer…

Meu mundo era melhor com suas ligações direto do banheiro da granja – único lugar onde conseguia fazer essas coisas.

Meu mundo era muito melhor com suas provocações, com seu apoio, com sua amizade, sua irmandade, suas broncas.

Com seu amor.

Eu gostava tanto da certeza de que ele gostava de mim.

Porque eu sempre gostei dele.

Gosto dele há mais de trinta anos – desde que o conheci pelos corredores da faculdade de comunicação.

Vou gostar pela eternidade.

Um amigo que se tornou um irmão, pra quem eu me expunha sem temor. Que partiu sabendo dos meus segredos inconfessáveis. E que insistia em me enxergar pelo melhor ângulo.

Como eu poderia não implorar a Deus para ele ficar?

Como eu poderia estar menos do que destroçada com sua partida?

Eu tô até aqui de saudades.

Eu tô com o coração sem espaço para tanta dor.

Daria um bocado de coisas para ele me chamar de novo no telefone, mesmo que fosse pra mangar de novo de mim, como fez da última vez em que me ligou.

Ri muito com ele “passando na cara” que, com a fama de arengueira que tenho (infelizmente justa), nunca tive a menor chance de ter razão quando a gente brigava.

– Tu podia até tá certa, anã, mas todo mundo ficava do meu lado…kkkkkkk

Até eu ficava do lado dele, mesmo que eu estivesse certa.

Porque ele era naturalmente justo. E bondoso sem fazer esforço.

Do tipo que gosta de ir embora cedo.

E ele avisou que  ficaria por pouco tempo.

Eu o advertia que detesto gente que morre.

Ele dizia que estaria por perto  e sempre viria puxar meu pé.

Eu o aconselhava a puxar uma parte mais interessante.

Ele respondia que puxaria o que bem entendesse.

Eu achava que era brincadeira.

Ele garantia que tinha certeza.

E agora eu acho que realmente não rezei direito.

Ou – começo a desconfiar – que Eduardo merecia mais do que essa vida que não é exatamente uma Brastemp.

Ele merecia tudo.

Inclusive todo o espaço que ocupa no meu coração, de onde jamais sairá.

Te amo meu amigo.

Te amo demais meu irmão.