Eu busquei palavras. Pesquisei de forma exaustiva. Recorri à minha memória. Entortei meu cérebro buscando fatos históricos que justificassem o feminicídio, mas tudo, absolutamente tudo, não me levou a um caminho compreensivo do que está a ocorrer no município chamado Belém. Não estou falando da cidade histórica e mencionada na Bíblia. Aquela que Maria pariu Jesus.
Falo de Belém, o da Paraíba mesmo. Uma terra pacata, cujo seu estômago foi revolvido por um crime brutal. Hediondo. Algo recheado com a mais pura deformidade, sendo inserido no fato a maldade nua e crua como ingrediente principal. Sim, estou a falar de um ser humano, talvez esteja eu enganado, e faça ele parte de outra categoria do reino animal que os biólogos ainda não detectaram, ou não descobriram.
Falo de um assassino covarde. E sem pudor ou remorso cristão, acuso-o de facínora com alto grau de perversidade. Sim, falo de um homem que veio ao mundo para sentenciar a morte da sua ex-esposa. Mãe dos seus filhos. Falo de Oberto Nóbrega de Barros Oliveira, conhecido como Betinho Barros.
Esse ser que está na minha pauta de nojo era ouvidor público e secretário de Comunicação da prefeitura do município de Belém, no Brejo da Paraíba. Ele, na sua covarde atitude, matou a ex-esposa a tiros, e tirou a sua própria na última quinta-feira. Algoz foi ele da jovem Rayssa Kathylle de Sá Silva, que estava nesse mundo de meu Deus por, apenas, 19 anos.
Guilhotinou o assassino vários sonhos de uma mãe e mulher, pondo-a em uma sepultura fria e solitária. Essa foi a primeira morte de Rayssa Kathylle. As outras vieram em forma de nota e até luto oficial na cidade por três dias.
Sim, a prefeitura decretou luto pela morte do assassino Betinho Barros, cujo nome no diminutivo é um escárnio à paz. Seria ele Betão, o suicida, o homicida. Em nota divulgada pela gestão municipal, há um treco que diz: “partida precoce e inesperada”, mas deveria ter continuado “do assassino e suicida covarde”.
O que há de conforto na nota emitida pelo poder Executivo de Belém é que Rayssa Kathylle foi citada. Mesmo que de forma superficial. Uma bruma que se dissipa na escrita como mero objeto ilustrativo.
A dor posta e exposta não está no assassinato da jovem e, sim, na partida do outrora ouvidor, secretário de Comunicação da prefeitura e ex-vereador.
Para Rayssa Kathylle foram negadas suas qualidades. “Apenas” morreu, e ponto final. E na malsinada escrita de pesar são citados nomes de parentes do carrasco. Mas a jovem morta, certamente pensou o escritor e os que aprovaram o texto, não merecia “crédito” algum.
Não existiu na tinta do poder vil o nome de um ente querido da vítima. Para essas pessoas insanas, não foi o “valente” Betão que explodiu a cabeça da mãe dos seus filhos. Mas o contrário.
E quando a tragédia dava sinais de esgotamento, eis que outra nota de pesar foi emitida para o desespero de todos que têm amor e paixão pela vida e pelo próximo. Pois bem, a Câmara Municipal de Belém, uma Casa que deveria emitir repúdio irrestrito ao assassino que um dia foi vereador, velou seu corpo antes do sepultamento.
E em sua nota de pesar, que foi um peso para a sociedade como um todo, o feminicida foi tratado como herói. Leia, e tente acreditar leitor, o que foi escrito para o assassino: “É com o profundo pesar que a Câmara Municipal de Belém anuncia o falecimento do Secretário Executivo de Comunicação Betinho Barros”.
E segue a famigerada: “Lamentamos a perda e nos solidarizamos com a família nesse momento tão difícil”. Não houve menção à vítima de feminicídio.
E por aqui eu fico, oferecendo à família de Rayssa Kathylle meu mais profundo pesar, bem como à família do assassino e suicida, pois todos são vítimas de Betão.
Após vigorosas críticas às notas, elas foram deletadas das redes sociais.